Fabricantes tradicionais reagem à expansão da montadora chinesa e alertam para risco de desindustrialização
Uma disputa entre a chinesa BYD e as principais montadoras que atuam no Brasil — como Toyota, General Motors, Volkswagen e Stellantis — tem colocado o governo em posição delicada. O centro da controvérsia está em uma proposta para reduzir, temporariamente, o imposto de importação sobre veículos elétricos desmontados, defendida pela BYD.
Em carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) — que representa as montadoras tradicionais — alertou que a medida pode colocar em risco os investimentos e empregos do setor. “Esse ciclo virtuoso de fortalecimento da indústria nacional será colocado em risco”, diz o documento, divulgado pelo presidente da Volkswagen, Ciro Possobom.
Segundo a Anfavea, permitir a importação de conjuntos de peças desmontadas como regra tende a enfraquecer o processo produtivo nacional. As empresas do setor afirmam ainda que planejam investir R$ 180 bilhões no país nos próximos anos.
BYD reage e acusa concorrentes de resistirem à inovação
Em nota encaminhada à Agência Brasil, a BYD rebateu as críticas e classificou a reação da Anfavea como uma forma de resistência à inovação. “É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria”, disse a montadora chinesa.
A empresa argumenta que a solicitação de redução temporária das tarifas tem o objetivo de garantir viabilidade até que sua fábrica em Camaçari (BA) esteja plenamente operacional. “O incômodo das concorrentes não tem a ver com impostos, nem com montagem, nem com empregos. Tem a ver com a perda de protagonismo”, provocou a BYD.
Camex analisa propostas divergentes das montadoras
O impasse será discutido pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC). A reunião extraordinária do Comitê-Executivo de Gestão (Gecex) acontece nesta quarta-feira (30) e analisará os dois pleitos em jogo:
- A Anfavea quer antecipar para 2026 a alíquota de 35% sobre importação de carros desmontados, prevista para 2028;
- A BYD solicita uma redução temporária da alíquota enquanto nacionaliza a produção.
Segundo a BYD, não faz sentido aplicar a mesma carga tributária para veículos prontos e para kits que são montados no país. A prática, segundo a empresa, já foi adotada por outras fabricantes em fases iniciais de operação no Brasil.
Governo estuda saída intermediária para o conflito
O vice-presidente e ministro do MDIC, Geraldo Alckmin, explicou que o governo trabalha com a lógica de transição gradual. Em 2023, os carros elétricos importados tinham alíquota zero, mas agora seguem um cronograma de aumento até chegar a 35%, equiparando-se aos veículos a combustão.
“Faça sua fábrica no Brasil, porque a alíquota vai ser igual a carro em combustão”, declarou Alckmin em entrevista recente.
O ministro disse que uma das soluções em análise é manter a elevação das tarifas para 2026, conforme deseja a Anfavea, mas ampliar a cota de importação com isenção temporária para atender parte do pleito da BYD. A proposta prevê um modelo com cotas decrescentes: 50 mil veículos no primeiro ano, 40 mil no segundo e 30 mil no terceiro.
“Você tem um imposto crescente e uma cota decrescente”, explicou o ministro. Ele sinalizou que a Camex poderá adotar uma medida intermediária que contemple parcialmente os dois lados. “Isso vai ser discutido no Gecex e depois na Camex, que envolve 10 ministérios”, concluiu.